Um pouco das aparentes contradições que coabitam harmoniosamente no caos de minh̕alma.
TORNA-TE QUEM TU ÉS!
As manifestações culturais contidas nesse site, como idéias e poemas
estão devidamente registradas e protegidas por direitos autorais.
Em formol
Um feto numa garrafa.
Como frutas na cachaça.
Boiando.
Me olhando através do vidro.
Amadurecendo idéias estranhas.
Imensos olhos meditativos... sorriam.
Braços abertos, dedos frios.
Como o gênio da lâmpada esperando as costas serem esfregadas.
Trancado.
Afogado.
Embebido em formol.
Embriagado em aldeído.
Numa prateleira empoeirada
como num armário de temperos.
Esperando o cozinheiro bêbado
para ser vagarosamente degustado.
Eu olhei para o seu rosto e ele me contou sobre a vida.
(Dylan W.)
Amor
Não, o amor não consola.
O amor engana.
Quem ama se mata
numa cruz ou numa cama.
O amor é um suicídio.
É a entrega da identidade.
É a infidelidade consigo mesmo
no vilipêndio a própria alma.
Quem acha que verdadeiramente ama
não só a si mesmo engana,
mas carrega nas costas um aleijado.
Alguém igualmente vazio
que busca também o que nunca irá encontrar.
Desista.
Não existe como se completar.
Deixemos todos livres.
E que mentira tão doce que é amar.
É o não ter em si e ter que ir buscar.
É a falsa lealdade com o outro.
Então pergunto:
Porque eu tenho que ficar,
se descobri que te amo tanto que não posso te amar?
(Dylan W.)
Má notícia
Na lamúria muda do olhar perdido
um sacrificio frustrado...esquecido.
Inútil é construir, nada resiste ao nada
e a poeira dos escombros lhe intoxicará a alma.
Inútil é parir, nada cresce do nada.
Esterilize-se com a certeza do vazio.
Abra as pernas do seu cérebro,
minhas palavras ejacularão cacos de vidro.
Esperanças são narcóticos que adiam a dor do inevitável.
Apenas entorpecem o desespero da espera pela mordida do destino.
Não...não sorria...
as muletas estão quebradas
e os doces foram envenenados.
A fé é um embrulho bem feito para uma caixa vazia.
Na falta dos amanhãs
noites engarrafadas...esvaziadas.
consumidas avidamente
uma a uma lubrificando atormentados pensamentos.
Eternas tavernas na alma.
Eu sou a brisa morna do verão que seus cabelos alcança.
O frio do vidro do copo e o calor do álcool que nele descansa.
Eu sou a lágrima seca congelada na face fria.
Um barco desertor abatido pela ventania.
O portator da má notícia.
Quando não há porquês,
no dia seguinte o que se faz?
Meu fuso não é horário, é anual.
Seu ponteiro roda no presente? ...o meu gira anos atrás
(Dylan W.)
Escuridão
Entre sombras existem brechas de luz,
então meus olhos se perdem ofuscados nos sorrisos do sol.
Dentes brancos me cegam,
queimam minha retina albina,
enquanto meus olhos verde-hematoma
choram pela ausência da noite.
Cerveja quente entre raciocínios...
Eu me esqueço dos copos entre pensamentos.
Cigarros se (me) consomem enquanto escrevo,
queimam calmamente até apagar...como eu.
Eu sou a paródia de cada vício.
A rosa que floresce nas madrugadas.
O filho rebelde que nos corredores vazios
enternece a escuridão das casas abandonadas.
(Dylan W.)
Bêbado
Nada é pouco se desperta o muito.
A alegria entrou pela janela,
vinda de longe, trazida por um vento que me arrepiou o pescoço.
Se arrastou serena como a fumaça do meu cachimbo com piteira de osso.
A alegria chegou inconveniente
aos gritos irreverentes e carnavalescos nos passos trôpegos de um bêbado falante.
Do outro lado da rua gargalhadas entravam sem ser convidadas
...mas foram muito bem recebidas.
Palavras que não consegui entender
mas que me diziam que eu também precisava beber.
Existem pessoas que ainda conseguem sorrir...
Um bêbado alegre em soluçantes regozijos fantasiosos
estava mais refestelado que o sábio mais profundo,
estava mais maravilhado que o milionário mais fecundo.
Cambaleando pelas armadilhas do asfalto boquiaberto
dançava no perfume dos próprios sonhos.
A música de uma gargalhada irônica me eriçou os pelos da curiosidade,
penetrando no âmago dos meus instintos,
se fundindo com tudo o que havia em mim de mais arruaceiro.
Ele caminhava sem destino
discursando para demônios sorridentes.
Com a alegria de um menino,
escancarando sua boca deformada e inchada
apesar dos poucos dentes que aparentava ter.
Da janela do oitavo andar cai em mim.
Tombei em baques nicotinados.
E meus olhos inchados puderam perceber que eu não via nada.
Que o que eu queria era estar naquela calçada.
Andando feliz.
Completamente embriagado.
(Dylan W.)
Goteira
Deitado na cama
ouço a chuva banhar o telhado.
A vejo surgir tímida nas rachaduras do teto
se espalhando pelo quarto numa invasão curiosa de lágrimas de estrelas.
Lá fora galhos seguram gotas,
que como perolas prateadas, penduradas, balançam serenas e vagarosas.
A chuva cai fina umedecendo o carpete,
goteiras pingam as horas mecanicamente como ponteiros molhados
e minha mente se locomove, move-se louca pelas frestas do tempo
pairando pelos sonhos esquecidos nas festas do vento.
A neblina viva toca minha janela, os vidros se embassam com os beijos da brisa
e as brechas aceitam o estupro sorrateiro da invasão do frio.
O céu me pergunta o porque da infância perdida
enquanto meus olhos chovem pelo lençol, gotejando partículas de mim mesmo.
Latrodectus mactans
Ostente essas medalhas no peito,
tão polidas e em cada uma a foto de uma vítima fatal.
O brilho que ofusca a quem te olha só cega quem não percebe que você só faz o mal.
Troféus espalhados pela sala
um por um, corpos na vala da tua boca tão profunda quanto imunda
que não cala o que é falso e parece açúcar, mas é sal.
Teu jeito de falar despreocupado,
tão controlado e simulado
é um cartão de visitas para abrir qualquer porta fechada.
Tua língua é a chave que destranca
o bom senso de quem nunca esteve propenso a ter a inocência violada.
Essa flor no cabelo
é o ornamento para o enterro
de quem você usou para provar a si mesma
que é muito mais do que nunca poderá ser.
A marca que você deixa
é um câncer na memória
de quem não consegue te esquecer.
Tudo o que você fez e o que ainda vai tentar
não vai acrescentar nada ao que você já é,
pois sei que você tem sua ética maculada por lascivas razões.
De todos que passaram pelas tua mãos
sou apenas mais um cadáver mutilado na mala das tuas recordações.
(Dylan W.)